sexta-feira, 1 de novembro de 2013

Garotos

Uma folha finíssima de papel, gravetos extraídos de bambu, “desfios” do algodão amalgamados em fio. Não havia nada na ponta inferior da linha. O garoto estava entre as nuvens. Voou e se aventurou, lutou bravamente como uma ave de rapina disputando a caça, como um caça em plena guerra, uma divindade alada supervisionando seus domínios.

quinta-feira, 24 de outubro de 2013

E Agora?

“E agora?” O conflito entre o Ímpeto Criativo e as Trevas do Compromisso era gritante. Toda a inspiração definhou frente ao súbito acúmulo de espessas nuvens de temporal. No lugar de trovões ecoava o “Preciso escrever algo hoje!”. Nada mais frustrante que o “Preciso”. Por que não “Quero”? Por que não “Desejo”? Até mesmo o “preciso” valeria, se fosse “necessidade”, não “dever”.

sexta-feira, 18 de outubro de 2013

Oceano

Foi assim, repentino como um espirro. Toda a existência se interrompeu. Não havia movimento, luz, trevas, som, silêncio, tempo … Imobilizou-se. Olhar fixo num ponto. Nada de especial. Uma mancha na parede. Umidade? mão suja? Poeira? não importava.

sexta-feira, 11 de outubro de 2013

O Sábio e o Chacal – Parte 2

Passara o tempo da submissão e da solicitude; chegara a hora do Chacal morder. Mordeu a mão que o alimentava. Não era um cão. Ignorava o conceito “lealdade”. Derrubou a montanha. Mirou o Sábio. Vacilou. O instinto oportunista avaliava prós e contras. Derrubar o Sábio renderia, sem dúvida, reconhecimento por parte de Hecatoma. Por outro lado, poupá-lo seria positivo caso se instalasse a nova ordem que seu alvo poderia trazer. O Chacal, naquele momento, era uma simples superfície, um campo de batalha à disposição do duelo travado entre o Sábio e Hecatoma. Folha ao sabor do vento. Retirou a tensão do arco. Baixou a flecha. Se foi a batalha ou a guerra, não se podia saber; por ora vencia o Sábio.

sexta-feira, 27 de setembro de 2013

O Sábio e o Chacal

Muito tempo atrás, em uma cidade esquecida por todas as histórias e lendas, um confronto ocorreu entre dois espíritos. Uma criatura imensa, consumida por insaciável fome, enfrentou o Sábio com sua lança. Errou. O Sábio contra-atacou com a força da palavra. A montanha caminhou até estar logo em frente ao Sábio, embora “logo acima” fosse o termo mais adequado. Ele arrancou a lança do chão e a partiu ao meio. O Sábio sabia que em Navarjari a lança era símbolo da vida militar. Perder a lança era perder a honra. Gaki estava renunciando ao seu posto. O Sábio avançou, colocando-se entre o ex-líder da guarda da cidade e a multidão.

sexta-feira, 20 de setembro de 2013

O Sábio e o Hasdj – Parte 2

O soldado ficou petrificado. Percebeu que acabava de participar de um duelo no qual havia perdido vergonhosamente. Como se um raio o atravessasse, a imensa compreensão atingida a partir das palavras do Sábio o sufocava. A clareza foi tamanha que quase atingiu a dimensão física; mais um pouco e lhe teria cegado. O líder saiu do caminho. Não houve comando, ainda assim os outros cinco, preenchidos de compreensão equivalente à do primeiro, relaxaram e recuaram. O Sábio avançou. Naquela altura já era grande o volume de observadores tornando impossível uma entrada discreta.

quinta-feira, 12 de setembro de 2013

O Sábio e o Hasdj

Muito tempo atrás, em uma época em que a informação não voava pelo ar e não saltava de cubos e tabuas de luz, valorizava-se a sabedoria, a qual gotejava lentamente de um espírito para outro em uma mágica relação na qual um vaso meio cheio, ao verter seu conteúdo sobre um vazio, concluía o processo pleno, ao lado doutro vaso pleno. Naquele “quando” existiu um “onde”, um vilarejo simples e pequeno, no qual floresceu um grande espírito. “O Sábio” era como o chamavam.

sexta-feira, 9 de agosto de 2013

Conto - O Sábio e o Homem do Inferno – Parte 2

Não era difícil encontrar o caminho. Havia uma trilha invisível no ar, um feixe de tristeza e desolação. Um curso no qual o canto dos pássaros era progressivamente mais baixo, até não ser mais ouvido. As árvores, com galhos espaçados e folhas vibrantes convertiam-se em emaranhados doentios; folhagens escuras transformavam os raios solares em lembranças distantes. O menino, porém, seguia. De algum modo todos os temores infantis em relação ao desconhecido que tinha adiante eram ofuscados por um medo ancestral de voltar atrás. Não podia recuar. Sobretudo, não podia falhar.

quinta-feira, 1 de agosto de 2013

Conto - O Sábio e o Homem do Inferno

Muito tempo atrás havia um pequeno vilarejo que prosperava ao redor de um austero palácio. Ali vivia uma família de origem desconhecida; um casal de andarilhos que pediu abrigo quando a mulher estava prestes a dar a luz. Os moradores, muito solícitos, acolheram a família e cuidaram da mulher como puderam, mas o parto foi extremamente difícil e a criança não resistiu.

sexta-feira, 26 de julho de 2013

Conto - O Sábio e o Tempo

Muito tempo atrás, quando o espírito do homem era jovem e a inquietude frente aos mistérios da vida sobrepujava a indiferença, existiu um velho que peregrinava pelo mundo compartilhando seu espanto. Poucos sabiam seu nome, mas todos o reconheciam quando se aproximava: “’O Sábio’ está chegando ao nosso vilarejo”, diziam uns, “Foi com ‘O Sábio’ que aprendi isto!”, suspiravam outros.

sexta-feira, 19 de julho de 2013

Despertar

Um momento antes era tudo e ao mesmo tempo nada; Tudo, porque infinidade de sons, cores, possibilidades, narrativas fantásticas, autenticamente sonho; Nada, pois tudo que reconhecia como algo o era “para si”, mas a plenitude do si viria em seguida, na exata proporção que a plenitude do “Tudo” se desfazia. Um momento depois era “Eu”, nem tudo, nem nada, apenas reconhecimento do dado, também reconhecimento da ausência do “Tudo” de instantes atrás, ao mesmo tempo em que espanto pela mínima conjectura da possibilidade daquele “Nada” que havia sido.

sexta-feira, 12 de julho de 2013

Conto - Espaços

Folhas brancas empilhadas sobre a mesa. Uma caneta azul de marca barata, destas que surgem sem ser compradas e desaparecem da mesma forma. Bem, as folhas não eram totalmente brancas. No verso, figuras, gráficos, relatórios, todo o tipo de impressão, importantes em um momento, inúteis no seguinte. O espaço em branco na face oposta à impressão representava um oceano de possibilidades. Era como vislumbrar o próprio espaço que antecede a criação de um Universo, supondo ser possível falar de espaço na ausência de um Universo.

quinta-feira, 16 de maio de 2013

Conto - Existiu


Foi como um abrir de olhos, mas nada havia para ver. De fato, não havia o que abrir. Ainda assim, foi como um abrir de olhos, como o despertar de um longo sono, embora não houvesse lembrança de sonhos, muito menos das vigílias que os antecedessem. Não havia qualquer lembrança, um fenômeno que intrigaria qualquer consciência racional, afinal, se não havia lembrança, não haveria domínio da língua e, sem esta, qualquer capacidade de inferir. Se não inferia, como se poderia supor alguma razão? E, sem qualquer razão, como teria consciência? Ainda assim, na plena ausência de língua, inferência e lembrança, percebia. Reconhecia o que lhe era imediato; “dado” e “passado” se entrecruzavam. Percebia as adjacências na sutil idéia de não-eu.

sexta-feira, 10 de maio de 2013

Conto - O Velho


Muito tempo atrás, num local esquecido pelos mapas, existiu um grande sábio, cujos ensinamentos reverberavam por toda parte, transformando tudo por onde passava; “O Sábio”, como era conhecido, peregrinava pelo mundo, vivia de esmolas e retribuía com conhecimento. Em certa ocasião, já no fim da tarde, muitos habitantes de um povoado começavam a se amontoar ao redor do Sábio, em busca de alimento para seus espíritos, já tendo concluído as tarefas diárias que lhes garantiriam o alimento do corpo. Ele estava sentado no chão, sem tapete que o separasse da poeira, roupas tingidas pelo mesmo vermelho da poeira que coloria todas as construções. Pelo menos dois terços da cidade estava sentado ao seu redor aguardando ansioso alguma grande maravilha escorrer de seus lábios.

sexta-feira, 1 de março de 2013

Conto - O Estrangeiro


Muito tempo atrás, em um reino já esquecido pelos livros de História e pelas lendas, existiu um grande sábio - “O Sábio”, como era conhecido por seus contemporâneos - cuja voz tinha o poder de trazer a Paz aos corações, a Sabedoria aos espíritos e a Harmonia às tribos. O Sábio não tinha casa, andava pelas ruas das cidades, pelos vilarejos, pelo campo, falando aquilo que lhe brotava do coração a todos os que se dispusessem a ouvi-lo. Antes de deixar sua casa, o Sábio habitava o palácio de seus pais. Era muito respeitado pelos moradores da região, não pelo poder econômico de sua família, mas pela sabedoria ancestral com a qual dirigiam aquela comunidade. Certa vez, um grande grupo de pessoas foi até o palácio em busca do Sábio e de seus conselhos.

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

Conto - Construindo Infernos!


Viveu toda a vida com base em uma premissa simples: “A vida deve ser feita de prazeres!”. A mim, simples transmissor daquela existência, não cabe qualquer crítica moral, denunciando erros ou acertos.

terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

Conto - Apoio Inusitado


Carlos era cristão. Mais especificamente, Católico. Não um destes “católicos não praticantes”. Havia escolhido abraçar sua Fé, participar das missas, grupos de oração, retiros, etc.

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

Conto - Insensatez


Sensato era estar ali, a margem da avenida, não da sociedade. Todas as manhãs, sentava-se à mesma mesa, saboreando seu café. Sensata era a cortesia que demonstrava ao garçom, um senhor já de idade avançada, ao qual já não mais dirigia o pedido; a xícara abastecida de café preto e leite à parte e o pequeno pote com açúcar mascavo alcançam a mesa simultaneamente à sua chegada. Sorriso respeitoso e “Bom dia!”.

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013

Conto - A Grande Tristeza


Muito tempo atrás existiu um grande sábio - “O Sábio”, como era conhecido por seus contemporâneos - cuja voz tinha o poder de trazer a Paz aos corações, a Sabedoria aos espíritos e a Harmonia às tribos. O Sábio caminhava por todos os lugares sem destino específico, indo ao encontro daqueles que desejassem dialogar.

sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

Conto - O Sábio e o Sacerdote


Muito tempo atrás, em um reino já esquecido pelos livros de História e pelas lendas, existiu um grande sábio - “O Sábio”, como era conhecido por seus contemporâneos - cuja voz tinha o poder de trazer a Paz aos corações, a Sabedoria aos espíritos e a Harmonia às tribos. O Sábio não tinha casa, andava pelas ruas das cidades, pelos vilarejos, pelo campo, falando aquilo que lhe brotava do coração a todos os que se dispusessem a ouvir. Dormia ao relento, sob pontes, em celeiros, decisão tomada pelo fim de cada dia.

sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

Conto - O nascimento dos deuses

Em um tempo inimaginavelmente anterior a “muito tempo atrás” nasceram os primeiros deuses. Algum tempo antes de “muito tempo atrás” ¹ um menino perguntou ao seu pai “Pai! Você é um tipo de deus?” ². Aqui encontramos a história de um menino, seu pai e o nascimento de todos os deuses:

sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

Conto - O Sábio e os deuses


Esta é mais uma história de algum tempo antes de “muito tempo atrás”! ¹ A história de um menino, seu pai e os deuses:

quarta-feira, 2 de janeiro de 2013

Conto - O Sábio e a Chuva


Um sábio não nasce sábio, a menos que lhe confiramos tal característica retrospectivamente. Ele não nasce adulto, não surge completo, formado, pronto. A história a seguir apresenta o sábio antes de “O Sábio”, a história de um menino, seu pai e a chuva: