No jardim de uma casa antiga
alguém sentava em um banco enferrujado! Sobre o colo, uma máquina fotográfica!
No display, uma imagem, na memória, uma ausência! O brilho da imagem ganhava
força conforme a penumbra do Sol, já posto, ia dando lugar às trevas.
O banco
ficava de frente para a casa, na qual o escuro marrom da madeira antiga
gradualmente se transformava em um acinzentado pesado, quase negro. Nenhuma luz
na casa. Nenhuma luz na rua atrás do observador! Na mente, uma profunda
saudade, inspirada pela foto! À saudade associava-se o espanto! Ignorava quem
era a pessoa da qual sentia tanta falta! Ignorava até mesmo quando teria batido
aquela fotografia. Tudo o que via eram as costas de um homem velho, sentando no
mesmo banco, mirando a mesma casa! A saudade e a angústia por ignorar de quem
sentia tanta saudade cresciam de forma exponencial, chegando ao desespero!
Lembrou-se de quando leu, n’algum
dicionário, o significado do verbete “angústia”. Vinham à mente definições como
“Aperto de coração, estado de exagerada ansiedade, aflição, sofrimento, etc.”.
Sentiu-se mergulhado em água gelada, profunda, escura, densa! Era incapaz subir
à superfície! Era incapaz de respirar! Precisava reencontrar o objeto de sua
saudade, precisava eliminar aquela ausência! Quando o desespero mostrou-se
insuportável, levantou. Correu até a porta, mas foi incapaz de abri-la. Não era
a fechadura que impossibilitava sua entrada, pois o simples movimento da mão ao
bolso bastaria para resgatar a chave e garantir o acesso! Não era também o
medo! De algum modo o desespero lhe tirava com o ar a racionalidade, pois
forçava a maçaneta violentamente, incapaz de lembrar-se da posse da chave! A
barreira à sua frente potencializava a angústia, a saudade, as trevas, a
ausência! Começou a correr ao redor do imóvel. Círculos e mais círculos! Não
era possível determinar se fugia ou se perseguia! Correu com mais força!
Respirou com mais força! Desejou com mais força! Correu para o portão,
abandonando o jardim. Com os dois pés no pavimento externo, deteve-se!
Recuperou o fôlego!
Como se algo o chamasse,
voltou-se novamente ao imóvel! À sua frente, uma casa quase negra! Entre ele e
a casa, um jardim! No jardim o escuro contorno de um banco enferrujado!
Ajoelhou-se! Não por qualquer desejo de prece, mas por falha em suas forças! No
banco percebia a silhueta de um homem velho, de costas, mirando a casa. Pensou
em chamá-lo, mas faltou força e voz! Ergueu a máquina, fotografando-o! Levantou
para ter com o velho, o qual se levantou no mesmo instante, correndo até a
porta, lutando contra ela! Viu o homem correndo ao redor da casa. Decidido a
descobrir seu rosto, perseguiu-o! Sempre um passo atrás! Sempre incapaz de
tocá-lo! Correu com mais força! Na última volta, viu o velho correndo para além
do portão de entrada! Sem forças para segui-lo, sem fôlego para chamá-lo,
derrotado, sentou-se no banco, mirando o pequeno pedaço de tecnologia em suas
mãos! No display, uma imagem, na memória, uma ausência! *
Nota:
*Escrito ao som de “Face in the photograph” -
Yanni
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