De perto pôde perceber que o estranho volume se tratava de um corpo,
agarrado ao toco de metal de tal forma que ainda se podia perceber seu
desespero pela vida. O corpo todo já estava ressecado como se estivesse a meses
sob o sol escaldante daquele deserto de um dia só. O couro seco agarrado aos
ossos e os trapos já desbotados davam aspecto de múmia ao defunto. Não fossem
as informações recebidas de seu próprio labirinto juraria que o homem morto
estava pendurado enquanto ele próprio caminharia na vertical. Esticou o braço e
tocou o corpo no abdômen, levando o corpo a se afastar um pouco e retornar em
seguida, balançando suavemente, sempre pendendo ao seu absurdo chão em algum
lugar na direção do poente. Percebeu que no pescoço do homem havia um objeto
metálico, o qual também “caía” para a direita do observador. Ficou se
perguntando se não seria aquela a origem dos reflexos observados no dia
anterior.
Outra Manhã (2°
capítulo)
Antes que pudesse analisar melhor o corpo percebeu o primeiro raio de sol
tocar-lhe a mão. Era insuportavelmente quente. Olhou para o alto da montanha e
viu aquela imensa luz tomar conta de todo o seu campo visual, como seu o
próprio sol estivesse a poucos quilômetros da Terra. Uma luz muito forte, muito
clara, a ponto de não se ver mais nada, só a luz. Sentiu seu corpo pender para
trás. Não sentiu o impacto mas percebeu-se deitado. A luz se afastou devagar e
havia dedos ao redor dela. Para além dos dedos uma face masculina e amigável à
sua esquerda. Um rosto enrugado e severo estava à direita.
- Está vendo isto? - Indagou ao outro o rosto amigável. - Parece estar
reagindo aos estímulos! - Respondeu o velho.
O homem deitado observou os dois homens em pé enquanto estes discutiam ao
seu respeito. Incapaz de mover o corpo para identificar onde estava, vislumbrava
apenas o teto branco e luzes fluorescentes. Respirou fundo e conseguiu,
finalmente, mover a cabeça. Havia uma máquina emitindo bips ao seu lado, uma janela
com cortinas brancas na parede à esquerda de sua cama (percebeu estar sobre uma
cama).Viu o homem velho, todo de branco, sair pela porta, na parede à direta, enquanto
o homem de rosto amigável, também de branco, retornou para perto dele.
- Fantástico! Fico muito feliz em tê-lo de volta. Sei que está confuso, mas procure não se estressar agora, apenas descanse. Teremos todo o tempo do mundo
para conversar.
Era evidente que estava em um hospital, mas não fazia o menor sentido
estar ali. Não sentia qualquer dor pelo corpo e não via nenhum tipo de soro
conectado ao seu braço, assim, descartou a possibilidade de algum tipo de
acidente. Por mais estranhos que fossem os rostos e apesar de toda a desorientação
decorrente de estar em um lugar sem qualquer ideia de como ali chegou, sentia
um certo conformo por ver que o mundo não fora destruído. Por outro lado,
refletia sobre os dois dias no deserto. Recordava do frio do asfalto e do calor
do sol, do toque do vento em seu rosto e do suor escorrendo enquanto subia a
serra. Detalhes demais para ser sonho ou ilusão. Lembro de Descartes.
Continua em #Vazio - Outra Manhã (2)
Isto dá um bom livro. Vá colecionando os capítulos e nos presenteie com o total de suas reflexões!
ResponderExcluirMuito obrigado pelo "bom livro". Fico muito feliz que tenha gostado.
ResponderExcluirMe explique: Quando diz "vá colecionando..." indica que deva guardar estes trechos e publicá-los de uma vez no fim?
É maninho.... trate de escrever um livro..ou de dar continuidade em algum inacabado...
ResponderExcluirPs.:Até eu que não gosto muito de ler..gostei muito desses seus escritos.
Obrigado Ju!!! Aproveite para exercitar a prática da leitura! Nunca é tarde para gostar de ler! Eu fui aprender isto só na Faculdade!
ResponderExcluir