Muito tempo atrás, em uma
cidade esquecida por todas as histórias e lendas, um confronto ocorreu entre
dois espíritos. Uma criatura imensa, consumida por insaciável fome, enfrentou o
Sábio com sua lança. Errou. O Sábio contra-atacou com a força da palavra. A
montanha caminhou até estar logo em frente ao Sábio, embora “logo acima” fosse
o termo mais adequado. Ele arrancou a lança do chão e a partiu ao meio. O Sábio
sabia que em Navarjari a lança era símbolo da vida militar. Perder a lança era
perder a honra. Gaki estava renunciando ao seu posto. O Sábio avançou,
colocando-se entre o ex-líder da guarda da cidade e a multidão.
- Hasdj não existe mais;
também Gaki há muito tempo deixou estas terras. Este é “Oteruihá no m’itzui”,
pois com muito pouco atingiu a ampla compreensão ¹.
Oteruihá não teve tempo de
pensar nos eventos, muito menos de avaliar a profunda transformação que
ocorreria em sua vida. Sentiu uma vespa ardendo no peito direito. Olhou para
baixo e viu dois terços da flecha negra ainda exposta. Também não teve tempo de
pensar nisto. A segunda flecha atingiu seu ombro esquerdo com muita força,
fazendo-o girar em torno do seu eixo e desabar. Voltando-se no sentido do qual
vinham os disparos a multidão apenas confirmou aquilo que a cor das flechas já
deixava claro. O Chacal estava ali. O mais eficiente arqueiro dentre toda a
guarda da torre, pronto para eliminar qualquer invasor ou traidor, conforme
instrução recebida diretamente de Gaki. Ninguém sabe o nome verdadeiro deste
arqueiro, pois não era nativo de Navarjari. O homem baixo e de pele
extremamente branca chegou à cidade perambulando pelo deserto ao lado de
mercadores. Covarde, bajulador e oportunista – daí o nome recebido - conseguiu
habilmente se introduzir na comunidade e na guarda. A destreza nata com o arco
conferiu-lhe o direto de utilizar as “flechas negras”, símbolo de destaque
entre a guarda da torre, subordinado apenas ao líder da guarda da cidade.
Chacal, sempre submisso e
extremamente solicito ao comando de Gaki, percebeu imediatamente o significado
da quebra da lança e a oportunidade que aquilo representava em sua busca por
poder.
Continua em O Sábio e o Chacal – Parte 2.
Nota:
1 Veja esta história em O
Sábio e o Hasdj
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