domingo, 6 de fevereiro de 2022

Regina (parte 3)

Se você ainda não leu a primeira parte, acesse Regina (parte 1)

      As crianças da aula de sábado adornavam com música as missas do domingo, uma abominação para muita gente, uma reunião de anjos para poucas pessoas. A missa do dia seguinte era especial, pois seria base de um casamento.

      Eleanor não tinha nenhum desejo especial pelo matrimônio. Não tinha as expectativas das outras meninas; o que a encantava era o brilho nos olhos de alguns casais. A maioria chorava, boa parte fingindo, só porque "todo mundo chora". Mas na parte dos rostos sem lágrimas havia uma luz única; da luz nos olhos a menina tentava deduzir o amor, nunca explicado em casa, distorcido na igreja com uma ideia de que quem ama morre pelo outro. O encanto do casamento sempre morria na decepção da saída da igreja. A menina pobre ficava com o coração despedaçado vendo tanta comida boa sendo jogada fora; o arroz projetado sobre os casais. Com a mãe aprendeu que era para dar sorte, mas se ter comida era fruto da sorte, como jogá-la fora poderia trazer sorte? Não era aquilo, justamente, uma ofensa à sorte?

      Domingo, missa, casamento, jantar, "Boa noite", nova semana. Via de regra o sábado era o dia mais alegre e aguardado; o domingo era uma confusa mistura de sentimentos, dada a alegria da música associada à certeza da aproximação da semana; a segunda-feira e tudo que vinha depois era um mar de cinza, monótono e cansativo.  De segunda à sexta acordava cedo para ajudar a mãe em suas tarefas, as quais consistiam em limpar a casa, alimentar os irmãos e lavar ou costurar roupas de outras famílias para obter alguns trocados; depois do almoço, mais labuta; após o jantar, aulas de leitura com o pai, matemática e etiqueta com a mãe. A família era pobre, mas não ignorante. Tanto o Alice quanto Timothy Rigby vinham de famílias originalmente nobres; títulos e propriedades haviam sido perdidos gerações atrás, em épocas de guerra, mas o zelo pela boa educação nunca foi esquecido.

Continua em Regina (parte 4)

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