"Não acredito!"
Havia tristeza e revolta na voz.
"O que aconteceu?"
"A corrente da minha avó se rompeu!"
"Aquela corrente?"
"É!"
Depois disso, lágrimas.
Era uma manhã de quarta feira, alegremente convertida em "domingo" em decorrência de um feriado local. O céu exibia seu mais lindo azul, poucas nuvens plenamente brancas dançavam enquanto o sol ensaiava o calor desconcertante que emitiria pouco mais tarde.
Amanda guardava com amor sobre-humano a corrente simples que ganhara da avó, Dona Eleanor.
Walter amava Amanda, amou Eleanor e, experiente em amor, compreendia em seu mais profundo intimo o significado da corrente. Se levantou e caminhou até a amada e apenas a abraçou. Bem sabia que nem sempre a palavra dita é o melhor caminho.
Paul era um homem simples, mas sábio. Caminhava na praia todas as tardes. Bebia vodca todas as noites. Da amada Eleanor escutava, quase sempre "Isso vai te matar!". Ele ria. Mais que qualquer médico ou exame, ele conhecia seu espírito, o seu corpo e o seus limites. Aos 80 ouviu de um médico "Você está melhor que eu, seu Paulo!"; "É Paul!", retrucou, "Porque meu pai era inglês!". Faleceu em um acidente. Qualquer um teria dito que tinha vigor para outros 80 anos de vida.
Como quem adivinhava a aproximação do fim, caminhou pela praia como sempre, mas entrou na feirinha da orla como nunca. Em uma loja de bijuterias se encantou por uma corrente. Comprou e pediu para embrulhar para presente. Um saquinho simples, com diferentes tons de azul e branco, simulando ondas de um mar agitado, mas não amedrontador.
Mais tarde, enquanto assistiam ao poente, antes da primeira dose de vodca, Paul tomou a mão de Eleanor e colocou o pequeno embrulho nela. Não disse nada. Não era inclinado ao romantismo falado, à poesia, à escrita. Amava em ato.
Ela abriu e, sorrindo, encontrou a corrente que seria sua companheira inseparável pelos próximos 10 anos. Tanta coisa depois disso: O falecimento de Paul, os campeonatos de surf de Amanda, o inconveniente carinho por Carlos. Realmente a vida é muito doida.
Certo dia Eleanor chamou a amada neta Amanda e lhe entregou a corrente. A jovem mulher sabia a origem e tentou recusar.
"Filha. Olha bem. Essa corrente não é sobre o amor específico do seu avô por mim. Essa corrente é sobre Amor, todo o tipo de amor. O que eu tive com ele, o que eu tenho por você, essa coisa nova com o Carlão. Também é sobre o amor pelas ondas do mar, pela areia, pela brisa. É, sobretudo, sobre os elos que criamos na vida. Eu quero que guarde com você, para que entenda e enxergue o amor em tudo!"
A menina chorou, agradeceu, abraçou a avô a aceitou o presente.
"Meu amor!", disse Walter.
"Correntes são uma sucessão de elos, cada qual agarrado aos dois mais próximos. Talvez um elo aberto não seja um fim, mas uma expansão. Em vez de abraçar apenas dois, agora abraça o mundo."
A moça sorriu. Por um instante teve certeza que se tivesse a chance de falar com Eleanor ou com Paul, talvez com Carlos, teria escutado a mesma coisa.
"Que vida maluca, né meu amor?", respondeu ao Walter.
"Por quê?"
"Porque você me deu a resposta que eu já tinha, mas eu precisava escutar."
"O que quer dizer?"
"Com meus avós eu aprendi esse amor com alvo. Com mira. Esse amor individual, que a gente sente por cada pessoa de cada vez. Mas, não foi só isso. Eles me ensinaram a amar sem condições, sem regras, sem imposições, sem exigências. Quando a gente exige, cria uma corrente de amor com o outro. As exigências são os elos. Mas quando a gente consegue amar por amar, sem exigir algo, não há elo. Há o amor aberto que você falou. Acho que esse corrente nasceu destinada a se romper."
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