- Ainda quer ir, mesmo vendo o que veio de lá? Você acha que consegue
andar?
- Não temos outro lugar para ir. Se tudo nos empurra para o Oeste, melhor
dar um pouco de trabalho, não?
Valdomiro riu. Ajudou o homem ferido a se levantar e esperou que se
vestisse. Marcus notou que o guardião também estava ferido, mas bem menos que
ele. Tivera um pouco mais de sorte.
- O que vamos fazer se aquilo voltar?
O guardião ergueu a lança e respondeu:
- Estaremos preparados!
Marcus colocou a calça, mas preferiu permanecer sem a camisa, temendo que
as fibras do tecido aderissem às feridas. Segurando em uma das mãos fez sinal
de que estava pronto. Foi até a borda da muralha, esperando encontrar algum
sinal daquilo que o havia agarrado no calcanhar, mas a névoa não permitia ver
muito além de seus próprios pés e não quis tentar descer naquelas condições de
visibilidade. Seguiram! Marcus tentou conversar com Valdomiro sobre o Hospital,
mas o guardião encerrou o assunto respondendo que ele mesmo raramente sonhava,
mesmo antes de irem parar naquele lugar. Para Marcus a interpretação simples
sobre suas experiências bastava para deixar de pensar no assunto, uma vez que a
dor era real demais para perder tempo declarando tudo aquilo ilusório. Não
podia simplesmente sentar e esperar o médico, tinha que quebrar os ovos.
Caminharam com o espírito amortecido. Os eventos da noite anterior
forçavam demasiadamente a sua sanidade. Falavam sobre trivialidades para não se
perder pensando naquele assunto. Passaram um bom tempo discutindo se o correto
seria “uma omelete” ou “um omelete”. Em seguida falaram sobre o curioso fato de
não exalarem odor, não obstante o longo tempo de caminhada e a ausência de
banho. Recordando-se ter visto em algum lugar que os odores provinham de
bactérias na pele humana, Marcus propôs que até elas o vento havia levado.
Valdomiro não levou muito a sério, achando que o cheiro era do corpo, não de “bichinhos”,
mas concluiu que seria bom se não existissem bactérias, já que evitaria
complicações nos ferimentos de ambos!
Depois disto a caminhada foi monótona e cansativa; Sem
mais assuntos, seguiram calados, chutando para o vazio as pedras, que eram cada
vez mais raras. O solo era cada vez mais maciço, mas continuaram descalços, já
que haviam abandonado os calçados em algum lugar do caminho. Horas depois, como
se tivesse um relógio suíço em sua mente, Valdomiro parou e alertou que estava
quase na hora. Marcus olhou para o céu e confirmou que a tênue aura do sol
estava quase no meio do céu.
Continua em #Vazio - A Fome das Sombras (3)
Nenhum comentário:
Postar um comentário