Valdomiro não se ofendeu, pois embora não tenha entendido parte das
palavras do gigante, compreendia que nada guardava antes mesmo que tal conversa
tivesse acontecido. Gostava da imponência do nome, mas não pretendia
convertê-lo em ação. Mesmo sendo um homem simples em relação às palavras, não
era simples em seu espírito, pois nunca deixava escapar, qualquer que fosse a
circunstância, o que era realmente digno de nota.
- Então Grande Rapaz! O que é que tens visto passar?
A palavra “tens” ficou ecoando em sua mente, enquanto ele se orgulhava da
forma como se expressou.
- Vento é o que vejo! Sombra, eu escuto! E tudo sucumbe à fome desta!
Tudo perece ante a força daquele!
Marcus ficou particularmente curioso pela Sombra! Com dois passos à
frente emparelhou-se com Valdomiro. Tomou parte do debate da seguinte forma,
não desejando ser deixado para trás em retórica e solenidade.
- Então esclareça, amigo! Peregrino de nome e de vida! O que é a Sombra?
Qual o propósito do Vento? O que há no Oeste?
- A palavra “amigo” não é uma senha tampouco uma chave! Não te tornas
amigo meu apenas por pronunciá-la! A mim ainda és um estranho! Não darei a ti
meus mistérios, se de ti nada recebi!
Marcus começou a se perturbar pelo excesso de palavras acompanhado do
vazio de resposta. Em seguida, como se um raio atingisse sua cabeça percebeu o
que o gigante buscava.
- Eu sou Marcus!
- Bem vindo, Amigo Marcus! Ensina teu amigo guardião a não entregar de
graça aos outros aquilo que nem é dele!
- Não entendo porque dá tanto valor aos nomes.
- Já para mim nada é mais claro. O que você pode possuir de mais próprio
que sua identidade? E o que é teu nome, se não a palavra que encerra em si tudo
o que é sua identidade? Eu li sobre a vida de homens que em nada se abalaram
frente ao imenso poder de suas divindades ou do próprio Deus. Mas todos caem de
joelhos quando Seu nome é pronunciado.
Marcus percebeu que estava diante de algum tipo de pregador. Sentiu-se
tolo por não tê-lo deduzido ao ver a cruz no chão. Desejou partir antes que
tudo aquilo evoluísse para uma tentativa de convertê-los, mas sufocou este
pensamento pela coerência que teve o comentário sobre o valor dos nomes.
- Antes que as perguntas desapareçam no Universo sem resposta, o que
seria um grande pecado, respondo-te. A Sombra é a ausência da Luz! O Vento é a
mão invisível da Luz, portanto, o propósito do Vento é o propósito da Luz! No
Oeste repousa minha agonia!
Valdomiro ficou impaciente com a conversa e as respostas que não
explicavam nada.
- Besteira! Não dê ouvidos a ele, rapaz! Sombra é sombra e vento é vento!
Com a luz a gente vê o chão e caminha para onde precisa ir! Qualquer outra
coisa que se diga é besteira!
Valdomiro era um homem simples. Sabia da vida o que a vida tinha
mostrado. Tinha muita fé, como havia aprendido com a mãe, mas também sabia que
do céu nada caia. Tudo o que queria, tinha que buscar! Acreditava em suor, não
em rezas! Marcus, por sua vez, mesmo incrédulo à grande parte do discurso do
gigante, permanecia curioso. Achava que no meio das palavras poderia garimpar
algum sentido mais concreto.
Continua em #Vazio - A Fome das Sombras (7)
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