segunda-feira, 10 de outubro de 2011

#Vazio - Outra Manhã

De perto pôde perceber que o estranho volume se tratava de um corpo, agarrado ao toco de metal de tal forma que ainda se podia perceber seu desespero pela vida. O corpo todo já estava ressecado como se estivesse a meses sob o sol escaldante daquele deserto de um dia só. O couro seco agarrado aos ossos e os trapos já desbotados davam aspecto de múmia ao defunto. Não fossem as informações recebidas de seu próprio labirinto juraria que o homem morto estava pendurado enquanto ele próprio caminharia na vertical. Esticou o braço e tocou o corpo no abdômen, levando o corpo a se afastar um pouco e retornar em seguida, balançando suavemente, sempre pendendo ao seu absurdo chão em algum lugar na direção do poente. Percebeu que no pescoço do homem havia um objeto metálico, o qual também “caía” para a direita do observador. Ficou se perguntando se não seria aquela a origem dos reflexos observados no dia anterior.

Outra Manhã (2° capítulo)

Antes que pudesse analisar melhor o corpo percebeu o primeiro raio de sol tocar-lhe a mão. Era insuportavelmente quente. Olhou para o alto da montanha e viu aquela imensa luz tomar conta de todo o seu campo visual, como seu o próprio sol estivesse a poucos quilômetros da Terra. Uma luz muito forte, muito clara, a ponto de não se ver mais nada, só a luz. Sentiu seu corpo pender para trás. Não sentiu o impacto mas percebeu-se deitado. A luz se afastou devagar e havia dedos ao redor dela. Para além dos dedos uma face masculina e amigável à sua esquerda. Um rosto enrugado e severo estava à direita.
- Está vendo isto? - Indagou ao outro o rosto amigável. - Parece estar reagindo aos estímulos! - Respondeu o velho.
O homem deitado observou os dois homens em pé enquanto estes discutiam ao seu respeito. Incapaz de mover o corpo para identificar onde estava, vislumbrava apenas o teto branco e luzes fluorescentes. Respirou fundo e conseguiu, finalmente, mover a cabeça. Havia uma máquina emitindo bips ao seu lado, uma janela com cortinas brancas na parede à esquerda de sua cama (percebeu estar sobre uma cama).Viu o homem velho, todo de branco, sair pela porta, na parede à direta, enquanto o homem de rosto amigável, também de branco, retornou para perto dele.
- Fantástico! Fico muito feliz em tê-lo de volta. Sei que está confuso, mas procure não se estressar agora, apenas descanse. Teremos todo o tempo do mundo para conversar.
Era evidente que estava em um hospital, mas não fazia o menor sentido estar ali. Não sentia qualquer dor pelo corpo e não via nenhum tipo de soro conectado ao seu braço, assim, descartou a possibilidade de algum tipo de acidente. Por mais estranhos que fossem os rostos e apesar de toda a desorientação decorrente de estar em um lugar sem qualquer ideia de como ali chegou, sentia um certo conformo por ver que o mundo não fora destruído. Por outro lado, refletia sobre os dois dias no deserto. Recordava do frio do asfalto e do calor do sol, do toque do vento em seu rosto e do suor escorrendo enquanto subia a serra. Detalhes demais para ser sonho ou ilusão. Lembro de Descartes.

4 comentários:

  1. Isto dá um bom livro. Vá colecionando os capítulos e nos presenteie com o total de suas reflexões!

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  2. Muito obrigado pelo "bom livro". Fico muito feliz que tenha gostado.
    Me explique: Quando diz "vá colecionando..." indica que deva guardar estes trechos e publicá-los de uma vez no fim?

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  3. É maninho.... trate de escrever um livro..ou de dar continuidade em algum inacabado...
    Ps.:Até eu que não gosto muito de ler..gostei muito desses seus escritos.

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  4. Obrigado Ju!!! Aproveite para exercitar a prática da leitura! Nunca é tarde para gostar de ler! Eu fui aprender isto só na Faculdade!

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